sábado, 4 de agosto de 2012

Também policial de carreira quer legalizar as drogas?



Cristo Redentor - RJ
bybetto.com

LEGALIZAÇÃO DAS DROGAS
PORQUE EU DIGO SIM - Por Francisco Chao de la Torre.

Preliminarmente, uma questão se impõe: o que é droga? A palavra “droga” – derivada do francês “drogue” – tem por sinônimos as
palavras “narcótico”, “entorpecente” ou “estupefaciente”,  e  é utilizada para denominar qualquer substância  química, artificial ou natural, que provoque alteração sensorial.
Droga é, portanto, toda e qualquer substância, natural ou sintética que introduzida no organismo humano modifica a percepção sensorial, alterando o comportamento e o humor do indivíduo. As drogas naturais são obtidas através de determinadas plantas, como, por exemplo, a cafeína (do café), a nicotina, (do tabaco), o ópio (da papoula) e o THC tetrahidrocanabiol (da cannabis). 

As drogas sintéticas são fabricadas em laboratório, exigindo para isso técnicas e equipamentos especiais.
No Brasil, de acordo com a vigente Lei de Drogas (Lei 11.343 de 23.08.2006, Artigo 1º, parágrafo único), droga é a substância ou produto capaz de causar dependência, assim especificado em lei ou relacionado em lista atualizada periodicamente pelo Poder Executivo da União.
E, para a medicina legal, em apertada síntese, droga é toda substância capaz de causar dependência física ou psíquica no ser humano.Destarte, considerando o conceito médico legal,  o  café,  o  cigarro,  a cerveja,  a  cachaça,  a  maconha e  a  cocaína  – para citar os exemplos  mais comuns no panorama brasileiro – são drogas, pois todas, sem exceção, além de modificarem a percepção sensorial e alterarem o humor e comportamento humanos, são capazes de causar dependência, física ou psíquica.
O que diferencia o café, o cigarro, a cerveja e a cachaça da maconha e da  cocaína é, como sabemos, o fato de que estas duas últimas estão classificadas como drogas ilícitas em lista – qual seja, a Portaria ANVISA 344/98 
– elaborada pelo Poder Executivo da União. Seu consumo e comercialização portanto, além de proibidos, são crimes, tipificados respectivamente no Artigo 28 e no Artigo 33 da referida Lei 11.343/2006.
E eu, já usei drogas? Sim, aliás, uso até hoje. Eu sou um viciado. Em café.Tomo café várias vezes por dia, algumas vezes, até frio.
E sei que café em excesso faz mal, pois excita em demasia, provocando distúrbios do sono, além de causar problemas gastro-intestinais.
E já fui um viciado em cigarros.Até 2007, eu fumava dois maços por dia. Parei de fumar porque não aguentava mais viver em conflito comigo mesmo, dividindo o prazer de aspirar, tragar e exalar a fumaça dos meus Marlboros e Camels, com o medo de desenvolver câncer na gengiva, na boca, na garganta e nos pulmões, além de outras doenças, digamos assim, “menores”, como por exemplo, enfisema, ou impotência.
Dra Maria Lúcia Karam
(Juíza Federal)
diretora da LEAP BRASIL
Congresso controversia.com.br.jpg
Tais  enfermidades, conforme sabe muito bem qualquer médico  – e os fumantes também o sabem, muito embora finjam que não – são consequência certa desse prazeroso hábito adquirido por espanhóis e ingleses com os índiosdas Américas do Norte, Central e do Sul, na época das grandes navegações.
Eu não lembro o dia exato em que parei de fumar, sei que foi no fim de 2007, mas lembro do motivo: eu estava sem cigarros, parei numa loja de conveniência de um posto de gasolina, e pedi dois maços, um de Camel, outro 
de Marlboro. Quando a atendente me entregou os dois maços, eu cumpri um velho ritual: olhei no verso dos maços, para ver qual era o aviso do Ministério da Saúde.
O aviso do maço de Camel era  “O Ministério da Saúde adverte: fumar provoca aborto”, com a fotografia de um feto humano em um vidro; o do maço de Marlboro, entretanto, era  “O Ministério da Saúde adverte: fumar provoca câncer de pulmão”, acompanhado da fotografia de um sistema respiratório completo (pulmões, brônquios, etc) completamente tomado por tumores.Com a maior cara de pau, olimpicamente, pedi à atendente: “meu amor, troca esse maço p’ra mim, me dá um Marlboro, daquele que faz abortar, por 
favor”. 
Francisco Chao de La Torre
 leapbrasil.com.br
A atendente, coitada, procurou um por um nos maços expostos, mas não encontrou nenhum Marlboro “dos que fazem abortar”, e, debochada, me entregou dois maços, dizendo: “olha, dos que fazem abortar não tem mais, só tem desses dois aqui, um dá impotência, outro dá câncer de pulmão, qual o senhor vai querer?”
Desisti do Marlboro, fiquei só com o Camel, e, dentro do carro, pensando no ser abjeto em que o cigarro me transformara, decidi parar de fumar. Joguei maço de Camel e isqueiro na lata de lixo, e, desde então, nunca mais fumei.
Quanto ao álcool, admito que aprecio cerveja, que consumo uma ou duas vezes por semana, em pequenas quantidades.
Muito embora na época da faculdade de direito, tenha, inúmeras vezes, tido aulas com o famoso e ainda atuante Professor Skol (aliás, você conhece alguma faculdade de direito que não tenha um ou mais bares nas poximidades? 
Eu não conheço nenhuma...) no bar em frente ao prédio da faculdade. Esss aulas eram tão interessantes que eu e muitos outros alunos matávamos as outras aulas, e só iamos embora, completamente embriagados, dirigindo nossos velozes carros e motos, quando o bar fechava as portas...
Um desses alunos, um calouro chamado Marcos, coitado, morreu voltando para casa porque algum idiota da companhia de eletricidade decidiu instalar um poste bem no meio da faixa principal de rolamento da avenida por onde ele, completamente, embriagado, dirigia seu carro novo, que o pai lhe dera há menos de três meses, como prêmio por passar no vestibular.
É, realmente,  “álcool e direção não combinam”,  “no Brasil morre mais gente em acidentes de trânsito do que na Guerra do Vietnã”,  foi o que nós comentamos no dia seguinte, quando soubemos da morte do Marcos, durante a aula do Professor Skol...Mas, a faculdade de direito terminou – eu me formei – e o meu consumo de cerveja vem diminuindo consideravelmente com o passar do tempo, resumindo-se a, como eu disse, duas vezes por semana, as vezes nem isso.
Cachaça, Wisky, Conhaque, etc? Não gosto.
Mas, e quanto às drogas ilícitas? Maconha? Nunca usei. Cocaína? Também não. Ecstasy? Também não.
Dra Maria Lúcia Karam
(Juíza Federal)
diretora da LEAP BRASIL
 bancodeijustiças.org.br
Nunca usei qualquer droga tida como ilícita.
E, quero deixar claro, não pretendo usar, nem as recomendo a ninguém, assim como não recomendo o uso das drogas tidas como lícitas.E não as usei, nem pretendo usar, não é por serem ilícitas (já que, apesar de proibidas, seu consumo e comercialização prosperam no Brasil, principalmente nas grandes metrópoles), mas porque, ao menos para mim, não 
exercem qualquer atração.
E, creio eu, eis aqui o cerne da questão. Será que os milhares de cigarros que fumei ao longo dos anos são 
inofensivos, se comparados, por exemplo, à maconha?
Claro que não.Todos os anos, milhares de pessoas desenvolvem doenças ligadas ao fumo, e a maioria dessas pessoas procura a rede pública de saúde que, por consequência, gasta enormes  quantias de dinheiro público com o tratamento dessas doenças.
Isso é um fato, como também é um fato que as indústrias do tabaco, por sua vez, recolhem grandes quantias de dinheiro aos cofres públicos, em impostos referentes à venda dos cigarros que produzem e comercializam, sendo 
certo que o cigarro, fato público e notório, é um dos produtos de mais alta tributação no Brasil.Também não vou, aqui, discorrer sobre as consequências do uso e abuso de  bebidas alcóolicas, sejam elas  – as consequências  – médicas (doenças, como, por exemplo, a cirrose hepática ou o alcoolismo, custos de tratamento, etc) ou sociais (violência doméstica, desagregação familiar, etc).Nem é preciso lembrar que as indústrias de bebidas alcóolicas recolhem grandes quantias de dinheiro, em impostos, aos cofres públicos, além de patrocinarem eventos esportivos (?!) e culturais (como, por exemplo, os 
famosos camarotes dos carnavais).
O fato é que, embora lícitas, são drogas que causam malefícios, mas geram empregos e impostos, e, justamente por serem lícitas, seu consumo e, principalmente, a sua comercialização, são, em maior ou menor grau, controlados pelo Estado.
Outro fato, incontestável, é que o ser humano, desde sempre, se drogou, e, infelizmente, vai continuar a se drogar.O que varia é o tipo de droga, de acordo com a cultura social e com o gosto individual, sendo que algumas drogas hoje tidas como ilícitas já foram 
lícitas, tendo sido inclusive comercializadas normalmente, como o são hoje o cigarro e a cerveja.E outro fato incontestável é que a proibição (ou proscrição) de certas drogas, ao contrário do que pensam muitas pessoas, não serviu para impedir 
seu consumo e sua comercialização.
Muito pelo contrário, a proibição serviu, apenas, como fomento do total descontrole do consumo e comercialização dessas drogas, que,  como já dito, prosperam nas grandes metrópoles, apesar da repressão, jurídica (fato definido como crime) e estatal (atuação policial).
E, a toda evidência, a proibição serve de pretexto para uma guerra, travada diuturnamente entre as forças policiais e aqueles que se dedicam à comercialização dessas drogas.
Algumas vezes, essa guerra é furtiva e sem baixas, como no caso da repressão policial às drogas sintéticas, muito populares nas classes mais abastadas.Outras vezes, essa guerra é escancarada e sangrenta, como a que é travada todos os dias, há pelo menos vinte anos, nas favelas do Rio de Janeiro. 
É uma guerra com baixas para ambos os lados, e, também, baixas para quem não está na guerra, mas vive no meio dela.
É o que os norte-americanos, com frieza, definem como  colateral damage, os danos colaterais, consequências da guerra, ou seja, as baixas civis.
Francisco Chao de La Torre
 leapbrasil.com.br
Ah, desculpe, eu já ia me esquecendo... Eu ainda não me apresentei. Eu sou policial. No Rio de Janeiro.
Eu assisto – e participo – dessa guerra há quinze anos.Mas não acredito mais nela.
Já acreditei, eu admito. E acreditei muito. Acreditei tanto que arrisquei minha vida e minha saúde, assim como a dos policiais com quem porventura trabalhei, dezenas de vezes.
E eles também acreditavam.Muitos deles acreditam até hoje. E continuam disputando uma “corrida de quem mata mais”, cuja linha de chegada jamais veremos, infelizmente.
E quando foi que eu deixei de acreditar nessa guerra? Quando percebi que, apesar das  muitas  baixas, de ambos os lados, 
apesar das prisões, apesar das apreensões – algumas delas, inclusive, enormes– de armamento e drogas ilícitas (fruto do brilhante, abnegado e corajoso trabalho dos mal remunerados e sofridos agentes policiais), o tráfico de drogas, tal e qual a mítica Hidra grega, a cada cabeça cortada, regenerava outras duas cabeças, mais venenosas e perigosas do que aquela que fora cortada.
Eu deixei de acreditar nessa guerra quando percebi que, a cada “Inimigo Público nº 01” preso ou morto pelas forças policiais, logo, em seguida, surgia outro “Inimigo Público nº 01”, para servir aos interesses da mídia.
É o famoso “Inimigo Público nº 01 da vez”...Eu deixei de acreditar nessa guerra quando percebi que eu, a exemplo dos muitos colegas policiais que, como eu, acreditavam estar fazendo o que era justo e correto, estávamos sendo usados, servindo de engrenagens para uma enorme máquina lubrificada por interesses políticos, alguns legítimos, outros ilegítimos.
E, principalmente, eu deixei de acreditar nessa guerra quando percebi que o preço que ela cobra dos policiais é muito alto.
Essa guerra, mais do que a nossa força laborativa, sacrificada em investigações ou operações policiais, mais do que o risco de vida, mais do que as vidas dos que tombaram pelo caminho, está deturpando nossos princípios e valores mais elementares...
É por isso que sou a favor da legalização das drogas hoje tidas como 
ilícitas. Eu não tenho ilusões. Sei que o crime não vai acabar, se o consumo e comercialização das drogas ilícitas forem legalizados.
O ser humano vai continuar a delinquir, coisa que, aliás, já o faz desde a antiguidade, como se depreende da leitura, por exemplo, da Bíblia sagrada.
Caim matou Abel, não porque estivesse drogado ou para drogar-se, mas por inveja. 
Sei também que muitas pessoas, sob o efeito dessas drogas, cometerão crimes terríveis, como homicídio, latrocínio, etc.
Mas isso já acontece hoje em dia, apesar da proibição. E muitas pessoas, sob o efeito de drogas tidas como lícitas, como, por 
exemplo, bebidas alcóolicas, cometem esses mesmos crimes.
Algumas pessoas, inclusive, sob o efeito de drogas adquiridas legalmente na farmácia da esquina, cometem o maior dos crimes, que é atentar contra a própria vida, muitas vezes, infelizmente, com sucesso.
Eu sou a favor da legalização das drogas sim.Sei que o crime não vai acabar.Mas sei que, com a legalização, vai haver controle, em maior ou menor grau (e, qualquer que seja o controle,  vai, certamente, ser  maior do que o 
atualmente existente), sobre o consumo e a comercialização dessas drogas.
E sei que, com a legalização, acaba o pretexto para essa guerra sem fim, na qual, como eu já disse, não acredito mais.
Uma guerra que, aliás, não devia nem ser guerra, mas que, com o passar dos anos, é nisso que se transformou. 
Se não é uma guerra, me responda então porque é que utilizamos carros de transporte de tropas e helicópteros blindados nas operações policiais nas favelas cariocas? 
Você pode até achar que, quando eu afirmo que não acredito mais nessa guerra, eu estou, na verdade, tentando disfarçar com retórica o fato de que, no jargão policial, eu fiquei “frouxo”, ou seja, estou com medo de morrer...
Cristo Redentor 
noeljunior10.blogspot.com 
Pois vou te contar um segredo, algo que não gostamos de admitir: todo policial tem medo de morrer, mas o medo maior não é esse, o medo maior é de ficar inválido, em cima de uma cama, como muitos, infelizmente, aí estão até 
hoje. O medo, muitas vezes, é até salutar, pois funciona como um “grilo falante”, ou seja, um conselheiro nas horas de perigo, você só não pode é se deixar dominar por ele.Só que, por paradoxal que seja, você não sente medo ao atuar, ao 
entrar em ação. Você só sente medo depois, em casa, quando relembra o que ocorreu. Na hora H, você simplesmente age, seja pelo treinamento, seja pelo instinto, e faz o que tem que fazer.
Eu não acredito mais nessa guerra porque tenho medo de morrer, mas sim porque, a toda evidência, ela é, e vai continuar a ser, inútil. Ok, você pode até continuar a achar que eu fiquei “frouxo”, esse, afinal 
de contas, é um direito seu, pense o que quiser...
Mas, venhamos e convenhamos, considerando a minha condição profissional, e o preconceito que cerca a questão da legalização das drogas, tem que ter coragem para afirmar o que estou afirmando aqui, não é mesmo?Aliás, se há alguns anos atrás você me dissesse que eu iria escrever um artigo defendendo a legalização das drogas, eu, muito provavelmente, iria achar que você estava drogado...
Eu mudei de opinião, porque, hoje, enxergo a questão pragmaticamente. E pode ficar tranquilo, pois eu não estou drogado, e, pode ter certeza, não pretendo me drogar, caso as drogas venham a ser legalizadas.Ser a favor da legalização das drogas não é a mesma coisa que ser a favor das drogas.
Eu sou, e sempre serei, contra as drogas, pois acredito, piamente, que devemos cavar masmorras ao vício e elevar templos à virtude.Também acredito que drogas, lícitas ou ilícitas, são nocivas, umas mais, outras menos, mas todas o são.E é por isso que defendo sua legalização, a exemplo das hoje já legalizadas, para que, pelo menos, o controle sobre elas e  suas nefastas consequências possa, mal ou bem, ser feito, pelo Estado. Mas, principalmente, porque essa guerra custa, em todos os sentidos, materiais e imateriais, muito mais caro do que a legalização.
Francisco Chao de La Torre
 leapbrasil.com.br
Essa é a minha opinião.
Rio de Janeiro, 30 de Janeiro de 2011.
Francisco Chao de la Torre
Inspetor de Polícia Civil
Rio de Janeiro - Brasil



Nenhum comentário: